sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Garotos Incríveis, de Michael Chabon




"Os escritores, diferentemente da maioria das pessoas, contam suas melhores mentiras quando estão sozinhos"


Às vezes tenho a impressão que existem mais livros sobre escritores e seu ofício do que sobre qualquer outro tema. Em apenas uma olhada rápida pra uma das prateleiras de livros da minha estante, identifico três: "Pergunte ao Pó", de John Fante, "Budapeste", de Chico Buarque e "Garotos Incríveis", de Michael Chabon. E se olhasse mais atentamente ou parasse pra pensar por dois minutos, a lista aumentaria exponencialmente.

Mas vamos aqui falar um pouco do último dessa categoria que conseguiu lugar na minha estante. Comprei num sebo, motivada pelo autor, de quem já ouvira falar tão bem. Acho que "Garotos Incríveis" (no original "Wonder Boys", o Wonder aqui sendo sobrenome não adjetivo como na versão brasileira, ou melhor, no inglês existe essa dualidade que se perde no português) vem a ser, creio, um dos romances mais reconhecidos de Chabon, então, seria uma boa maneira de começar.

Wonder Boys, no livro, é o título do romance inacabado do protagonista, o professor universitário Grady Tripp. O protagonista também é o narrador, o que faz que a gente mergulhe na mente de um escritor em volta da conclusão de seu livro, de mais um casamento fracassado, de seus vícios, do seu editor, de seus alunos e de todos seus outros tormentos. E mergulhar na mente de alguém, ainda mais da de um escritor, pode ser confuso e diluído, mas ao mesmo tempo interessante e reflexivo.

A ação do livro se passa em dois dias. Somos guiados pela mente de Tripp até o fim daquela jornada e, por vezes, nos vemos mais energéticos, envolvidos e instigados, e em outras, mais letárgicos, distantes e entediados.


O livro virou filme, estrelado por Michael Douglas e com Bob Dylan na trilha sonora. As sensações que o filme desperta são as mesmas do livro, sendo que no último, como costuma ser, é tudo mais detalhado. Na minha opinião, o que valeu a leitura e o filme foram os momentos sobre literatura.

Uma das partes mais interessantes do livro é quando Grady Tripp nos explica o que ele chama de doença da meia-noite que ataca os escritores, fazendo um paralelo entre eles e os insones. Eu como insone profissional e escritora amadora, me identifiquei total. Fiquem com as palavras de Tripp sobre o assunto:

"A doença da meia-noite é uma espécie de insônia emocional; a cada momento consciente sua vítima - mesmo se escreve de manhã ou no meio da tarde - sente-se uma pessoa deitada num quarto sufocante, com a janela aberta, olhando para um céu cheio de estrelas e aviões, ouvindo a narrativa de uma persiana barulhenta, uma ambulância, uma mosca presa numa garrafa de Coca, enquanto ao redor os vizinhos dormem a sono solto. Na minha opinião é por isso que os escritores - como os insones - são tão propensos a acidentes, tão obcecados com cálculo do azar e das oportunidades perdidas, tão dado à ruminação e à incapacidade de abandonar um assunto, mesmo quando lhe pedem repetidamente para fazê-lo"


3 comentários:

Unknown disse...

teve coragem de terminar de ler, Sam? rs

Acho que nunca serei uma escritora de verdade porque durmo muito bem. Mas essa temática dos escritores meio atormentados muito me atrai. Valeu pela dica!

Samara disse...

Mas Ferdi não precisa ser insone pra ser escritor de verdade, a doença da meia-noite é só uma insônia emocional,rs

Unknown disse...

Que interessante Sam! Eu gosto muito de livros que abrem o universo do escritor e, como você disse, não são poucos e não me lembro de ter me decepcionado com algum. Quem gosta de escrever sempre se identifica. Esse negócio de ser insone, como você disse pra Ferdi, não é um critério, mas digamos que é algo comum. Acho que já não tenho insônia, mas essa doença, essas asas da imaginação sempre me pegam... Adorei!